domingo, 13 de dezembro de 2009

Redenção


I

Vozes do mar, das árvores, do vento!
Quando às vezes, n'um sonho doloroso,
Me embala o vosso canto poderoso,
Eu julgo igual ao meu vosso tormento...

Verbo crepuscular e íntimo alento
Das cousas mudas; psalmo misterioso;
Não serás tu, queixume vaporoso,
O suspiro do mundo e o seu lamento?

Um espírito habita a imensidade:
Uma ânsia cruel de liberdade
Agita e abala as formas fugitivas.

E eu compreendo a vossa língua estranha,
Vozes do mar, da selva, da montanha...
Almas irmãs da minha, almas cativas!

II

Não choreis, ventos, árvores e mares,
Coro antigo de vozes rumorosas,
Das vozes primitivas, dolorosas
Como um pranto de larvas tumulares...

Da sombra das visões crepusculares
Rompendo, um dia, surgireis radiosas
D'esse sonho e essas ânsias afrontosas,
Que exprimem vossas queixas singulares...

Almas no limbo ainda da existência,
Acordareis um dia na Consciência,
E pairando, já puro pensamento,

Vereis as Formas, filhas da Ilusão,
Cair desfeitas, como um sonho vão...
E acabará por fim vosso tormento.

Antero de Quental, in "Sonetos"

domingo, 8 de novembro de 2009

O valor das coisas...


O valor das coisas não está no tempo em que elas duram, mas na intensidade com que acontecem.

Por isso existem momentos inesquecíveis, coisas inexplicáveis e pessoas incomparáveis.



Fernando Pessoa

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

Feliz Só Será


Feliz só será
A alma que amar.

'Star alegre
E triste,
Perder-se a pensar,
Desejar
E recear
Suspensa em penar,
Saltar de prazer,
De aflição morrer —
Feliz só será
A alma que amar.


Johann Wolfgang von Goethe, in "Canções"

quinta-feira, 1 de outubro de 2009

Lágrimas Sem Sentido


Tantas incertezas, tanta dor...


Lágrimas de dúvida, de medo...


Nunca me senti assim antes.


Agora envolvida neste turbilhão de sentimentos, não tenho saída!!

Não encontro nenhuma porta aberta...


E assim, vou ter de esperar e refugiar-me nas minha lágrimas, lágrimas sem sentido...


domingo, 13 de setembro de 2009

Há Palavras que Nos Beijam


Há palavras que nos beijam
Como se tivessem boca.
Palavras de amor, de esperança,
De imenso amor, de esperançar louca.

Palavras nuas que beijas
Quando a noite perde o rosto;
Palavras que se recusam
Aos muros do teu desgosto.

De repente coloridas
Entre palavras sem cor,
Esperadas inesperadas
Como a poesia ou o amor.

(O nome de quem se ama
Letra a letra revelado
No mármore distraído
No papel abandonado)

Palavras que nos transportam
Aonde a noite é mais forte,
Ao silêncio dos amantes
Abraçados contra a morte.

Alexandre O'Neill, in 'No Reino da Dinamarca'

terça-feira, 8 de setembro de 2009

Tudo quanto Sonhei se Foi Perdido


O que sonhei e antes de vivido
Era perfeito e lúcido e divino,
Tudo quanto sonhei se foi perdido
Nas ondas caprichosas do destino.

Que os fados em mim mesmo depuseram
Razões de ser e de não ser, contrárias,
Nas emoções que, dentro em mim, cresceram
Tumultuosas, carinhosas, várias.

Naqueles seres que fui dentro de um ser,
Que viveram de mais para eu viver
A minha vida luminosa e calma,

Se desdobraram gestos de menino
E rudes arremedos de assassino.
Foram almas de mais numa só alma.


Francisco Bugalho, in "Dispersos e Inéditos"

segunda-feira, 7 de setembro de 2009

Todas as Noites me Sinto


Todas as noites me sinto
igual aos desconhecidos.
Sou a criança que sou,
só quando o tempo pára.

Fico em mim,
fora dos músculos.

Por que se movem os deuses
quando o sol cresta as formigas?
Lendas da luz da noite
secam todo o movimento.

Seguro a vida
por desespero.



Orlando Neves, in "Trovas da Infância na Aldeia"

sábado, 29 de agosto de 2009

Viagem...




Voar, voar, voar...
Sem fim ou destino,
Sem terra ou caminho,
Onde irei parar.


É isso que eu vou fazer! Voar, voar, voar... Por terras nunca antes vistas... Por sentimentos nunca antes sentidos... Por caminhos nunca antes pisados...

Eu vou voar!

É nesse voo, nesse voo tão esperado, que eu vou sonhar, sonhar e sonhar...




sexta-feira, 28 de agosto de 2009

Timidez


Basta-me um pequeno gesto,
feito de longe e de leve,
para que venhas comigo
e eu para sempre te leve. . .

— mas só esse eu não farei.

Uma palavra caída
das montanhas dos instantes
desmancha todos os mares
e une as terras mais distantes..

— palavra que não direi.

Para que tu me adivinhes,
entre os ventos taciturnos,
apago meus pensamentos,
ponho vestidos noturnos,

— que amargamente inventei.

E, enquanto não me descobres,
os mundos vão navegando
nos ares certos do tempo,
até não se sabe quando...

— e um dia me acabarei.
Cecilia Meireles

segunda-feira, 24 de agosto de 2009

A Armadura


Desenganos, traições, combates, sofrimentos,
Numa vida já longa acumulados, vão
— Como sobre um paul contínuos sedimentos,
Pouco a pouco envolvendo em cinza o coração.

E a cinza com o tempo atinge uma espessura
Que nem os mais cruéis desesperos abalam;
É como tenebrosa, impávida armadura
Ou couraça de bronze em que os golpes resvalam.

Impermeável da Inveja à peçonhenta bava,
Nela a Calúnia embota os seus dentes ervados;
Não há braço que possa amolgá-la, nem clava
Que nesse duro arnês se não faça em bocados.

E no entanto, através dessas rijas camadas,
Ou rompendo por entre as juntas da armadura,
Escorrem muita vez gotas ensanguentadas
Que o coração verteu dalguma chaga obscura...


António Feijó, in 'Sol de Inverno'

domingo, 23 de agosto de 2009

Sonhos...

Quando se está perdido num sonho...
Não há palavras para explicar...
Ficamos completamente perdidos nele, e ás vezes esquecemos tudo o resto!!
E envolvemo-nos de tal maneira nele que acabamos por nos magoar.
Eu quero sonhar, eu quero amar... Ser amada... Sentir o meu coração a palpitar!!
Eu quero...
Mas não me quero magoar!

Lua Adversa


Tenho fases, como a lua,
Fases de andar escondida,
fases de vir para a rua...
Perdição da minha vida!
Perdição da vida minha!
Tenho fases de ser tua,
tenho outras de ser sozinha.

Fases que vão e que vêm,
no secreto calendário
que um astrólogo arbitrário
inventou para meu uso.

E roda a melancolia
seu interminável fuso!

Não me encontro com ninguém
(tenho fases, como a lua...).
No dia de alguém ser meu
não é dia de eu ser sua...
E, quando chega esse dia,
o outro desapareceu...


Cecília Meireles, in 'Vaga Música'

Sentimentos


Poder sentir, mas não poder sonhar!!

Eis o meu pequeno grande dilema!

Quero poder sentir! Quero poder sonhar!

Quero ter a liberdade que vai no meu simples coração.

Quero. Eu quero sentir! E sim eu quero sonhar!

E nunca mais parar. Mas não quero ter rumo certo.

Quero apenas sentir e sonhar!
Obrigado por visitarem o meu blog!